Após concluir minha comunicação no IV Simpósio Ibero-Americano de Cartografia História, em Lisboa, os participantes do evento foram levados a um passeio pelo Palácio de Mafra, nas proximidades da capital, onde seria inaugurada uma pequena exposição de cartografia histórica. Lá chegando, fizemos uma visita especial à biblioteca do Palácio, que normalmente pode ser vista apenas da porta. A biblioteca é linda. Mas não foi a vista da biblioteca que realmente me fez ganhar o dia, e sim a história contada pela bibliotecária.
Ela começou a contar a história da biblioteca, os catálogos feitos no século XVIII e XIX, e a preservação dos livros. E foi nesse último tema que ela disse que os três principais motivos para eles não terem trabalho com a preservação dos livros eram: “a temperatura natural da biblioteca, a umidade, e a colônia gigante de morcegos que nós temos aqui no Palácio”. É claro que depois disso ninguém queria saber que a temperatura ali dentro não variava com as estações, nem que a madeira, o espaço entre as prateleiras e o vazio interior da estrutura impedia que a umidade chegasse aos livros. As pessoas queriam era saber dos morcegos!
Segundo ela, há mesmo uma grande colônia de morcegos que habita as regiões do Palácio, e que nunca foi estudada por biólogos — estudos começaram agora. Esses morcegos à noite se apertam entre as frestas das portas e janelas e passeiam pela biblioteca onde, toda noite, comem o equivalente a metade do seu peso em insetos.
Aquilo fez o meu dia. Onde no mundo há uma biblioteca que pode dizer que não se preocupa com produtos químicos para traças e comedores de livro em geral porque tem uma equipe de morcegos sempre pronta para ajudar? Saí de lá fascinado, com a beleza da Biblioteca do Convento de Mafra, com o acervo enciclopédico fantástico, e com os simpáticos morcegos que, sem saber, ajudam a preservar um patrimônio sem valor.